Capítulo 5 – Fão

Por Victor Fão

Antes de mais nada, achei sensacional a ideia da Nomade Orquestra fazer um
blog. Sou muito, muito grato por fazer parte desse coletivo e poder expandir
minhas ideias e sonhos, tanto musicais, quanto artísticos.
Pra quem não me conhece, sou o Victor Fão, mais conhecido como Fão, mas pode
me chamar como quiser. Sou trombonista da Nomade, toco também com Samuca
e a Selva e Buena Onda Reggae Club.

Começando do começo, conto a vocês minhas primeiras relações com a música.
Pai, rockeiro convicto, que ouvia muito Pink Floyd, Beatles e Ramones (ahhh o
Punk Rock, vai um texto inteiro pra falar sobre isso. Quem sabe no próximo…) e
tinha uma boa coleção de vinil (felizmente, são todos meus hoje). Mãe, uma
apaixonada por música brasileira, estudou piano quando criança e gostava muito
dos clássicos brasileiros como Caetano, Chico e Gil… nós passávamos as tardes
cuidando da casa, pirando e dançando ao som de Spyro Giro, do Jorge Ben.
Tive a fase rock, a fase metal, a fase punk hardcore (duradoura), a fase hippie paz
e amor, a fase regueiro, a fase psicodélica, e todas as fases culminaram a quem
sou hoje. Paralelo a tudo isso, sempre tive na família o estímulo para buscar as
artes. Minha mãe e minha vó, que sempre estavam com os pincéis na mão, me
deram esse empurrão para seguir nesse caminho também. Além de músico, sou
ilustrador e artista plástico, e é mais ou menos sobre isso que vou falar em
grande parte dos textos da minha coluna aqui no blog, com uma grande ênfase
nos quadrinhos, arte sequencial que me fascina tanto e que escrevi a primeira
quando tinha uns 9 anos. Ela falava sobre um dia que fui com meu pai assistir um
jogo do Corinthians no Pacaembu. Minha breve carreira como quadrinista
acabou ai, mas já já ela volta.
Na postagem de hoje vou falar sobre um clássico dos quadrinhos que virou filme:
Ghost World, de um dos meus quadrinistas preferidos, Daniel Clowes. Clowes
tem uma aptidão gigante pra falar sobre o cotidiano e em Ghost World ele tira
isso de letra, as duas personagens principais, Enid e Rebecca, recém saídas do
colégio, vivem uma vida normal e levemente excêntrica numa cidade no interior
dos Estados Unidos da década de 90. Discos de vinil e fitas cassete, ligações de
telefone fixo e um encontro mais leve, diferente dos encontros de hoje, marcados
pelo “Black Mirror” do celular.

Clowes consegue escrever sobre o universo pós-adolescente com maestria e
simplicidade. Você que cresceu numa vila, levando uma vida tipicamente vileira
vai entender do que estou falando. O autor diz no prefácio de umas das edições
que consegue escrever diálogos tão convincentes de duas adolescentes, porque no
fundo ele ainda raciocina como um adolescente, e nesses diálogos a gente
consegue sentir o frescor da vida de jovem e percebe que realmente é difícil se
ver como um adulto e que ainda vivemos uma sintaxe de pensamento bem
adolescente.
Analisando os traços, principalmente os das personagens, a gente percebe que
tem uma maturidade super displicente, de um cara que conseguiu retratar muito bem toda aquela vontade do jovem de ser diferentão, além de todo o cenário maravilhoso e super bem desenhado (referência máxima pra mim).
Nos anos 90, saiu um filme baseado nos quadrinhos, um quase classic cult,
estrelado por Thora Birch (como Enid) e Scarlett Johansson (como Rebecca). O
filme tem algumas cenas muito boas e muito fiéis aos quadrinhos e outras que
não tem nada a ver. O roteiro também difere bastante, por exemplo, no filme a
Enid não tem um Rabecão (carro funerário) como ela tem nos quadrinhos. Revi o
filme esses tempos e confesso que vale muito a pena assistir, mas o conselho
maior é ler os quadrinhos. Inclusive, leia tudo do Daniel Clowes, ele é zica máxima.
A playlist que fiz é uma playlist pensada nas meninas de Ghost World e no que a
soberba adolescente delas escutaria na geração Spotfy. Então, tem Calypso de
Trinidad, tem música Balcan da Romênia, tem som da Etiópia, ragtime e blues
antigueira, enfim, sons digamos excêntricos que combinam perfeitamente com
Enid e Rebecca.
Ah, lembrando que em todas as minhas colunas, terá um desenho inspirado no
assunto. Dessa vez, peguei as referências de traço do Clowes e joguei em cima do
meu universo de adolescente que se resumia em Skate e Punk Rock. Espero que
todos desfrutem desse texto e do desenho e aproveitem a playlist. Até a próxima!